sábado, 10 de novembro de 2007

Meio Ambiente: Neutro em culpa

(Notícia publicada no site do IDEC)

O consumidor não "compensa" suas emissões de gás carbônico simplesmente caindo nos apelos de marketing das empresas "carbono-neutras"; e uma consciência mais leve não alivia as mudanças climáticas

Várias empresas ou eventos têm prometido compensar suas emissões de gases de efeito estufa, causadores do aquecimento global, com projetos que incluem, por exemplo, o reflorestamento de alguma área. Isso porque as árvores, durante seu desenvolvimento e crescimento, "capturam" o gás carbônico (CO), grande vilão das mudanças climáticas. Só que o que ninguém diz é que essa captura leva várias décadas, e não é do dia para a noite que as toneladas de carbono emitidas por uma ou outra atividade serão "neutralizadas", como dizem.

Os postos Ipiranga estão com uma campanha dessas. A promessa é de que, ao abastecer seu carro utilizando o cartão de crédito da rede, o consumidor neutralizará o gás carbônico gerado pela queima do combustível. Várias outras empresas aderiram à onda, como o portal de internet iG, os bancos Bradesco e ABN Amro, a Volkswagen Caminhões. "Também pode-se neutralizar qualquer evento, como concertos musicais e até casamentos", afirma Eduardo Peti, diretor da Max Ambiental, que desenvolve projetos nessa área. A São Paulo Fashion Week é um exemplo de grande evento que "neutralizou" suas emissões.

O caso do Ipiranga é emblemático. Os combustíveis fósseis utilizados nos transportes são a maior causa do aumento do efeito estufa. Portanto, é contraditório e questionável que uma empresa que viva de contribuir para as mudanças climáticas ofereça a absolvição do pecado do consumidor que compra seu produto. Mas o fato é que a empresa não está sozinha, já que a Toyota, a Honda e a British Petroleum também aderiram à "neutralização", embora, por definição, promovam a poluição.

A forma mais comum de neutralização no país, dentro do chamado mercado voluntário, é o reflorestamento. Mas para que realmente surta algum efeito, são necessários 30 anos, em média, para o desenvolvimento da vegetação típica de Mata Atlântica, por exemplo. Portanto, é fundamental que haja o acompanhamento da vegetação cultivada. Segundo cálculos da Max Ambiental, para cada tonelada de carbono emitida é necessário plantar cinco árvores.

Em suma, é recomendável que o consumidor seja mais atento e crítico, e de fato reduza suas emissões, mais do que se preocupar em compensá-las. Como? Locomovendo-se menos de carro, trabalhando e estudando próximo de casa (quando possível), consumindo menos embalagens e menos produtos supérfluos. Mesmo assim, é extremamente positivo que tanta gente, e tantas empresas, tenham passado a dar mais atenção para as emissões de gases do efeito estufa. "A neutralização de carbono é possível", afirma Luís Henrique Piva, coordenador da campanha de Clima da organização ambiental Greenpeace.

"Só é preciso tomar cuidado com o que está aparecendo por aí. Não se pode vender algo dessa forma, como se estivesse vendendo um pedacinho do céu," diz. O pior é que tem muito consumidor que acaba comprando a idéia, por acreditar que está automaticamente contribuindo para reduzir as emissões e, por isso, garantindo seu lugar no paraíso.